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Mais marqueteiros do passado

Se algum candidato se disser parecido com Leonardo da Vinci, fuja


O post da semana passada sobre próceres da música, da literatura e da pintura que se saíam bem na promoção da própria arte chamou a atenção dos leitores. Então, se as vagas para o departamento de marketing da sua empresa ainda estiverem abertas, aqui vão mais dicas de perfis afamados nos quais inspirar seu hunting e suas job descriptions. O escritor francês Júlio Verne (1828-1905) celebrizou-se pelo romance aventuresco "A volta ao mundo em 80 dias", aquele em que um cavalheiro é desafiado a percorrer o planeta em menos de três meses valendo-se das modernidades do transporte de fins do século XIX. Opa, alguém falou em transporte? Se o livro é uma grande celebração dos avanços tecnológicos da mobilidade humana, e o protagonista viverá a embarcar e desembarcar de navios e trens, por que não mencionar os nomes das companhias do setor em meio ao texto – assim, como quem não quer nada? Pois Verne queria, tanto que vendeu os naming rights a essas empresas, antecipando o que Hollywood faria a torto e a direito no século seguinte com os product placements.


Falando em merchan no cinema, um tal de Thomas Edison (1847-1931) foi pioneiro em incluir o nome de suas empresas nos primeiros filmes mudos. Tão precursor quanto Ludwig van Beethoven (1770-1827), que ganhava instrumentos de graça para funcionar como garoto-propaganda do fabricante – ou endorsee, como se diz na indústria musical atualFaltam referências brasileiras neste panteão de profissionais? Não mais. Carmen Miranda (1909-1955) percebeu que sua figura exótica era um trunfo no primeiro mundo, e tratou de capitalizar sobre ela. Fez parceria com varejistas para vender seus turbantes característicos e inventou o salto plataforma a partir da própria necessidade – baixinha, tinha de dar um jeito de se agrandar no palco e nas telas.


E já que chegamos à seara da criação de produtos, cabe um alerta. Se algum candidato aparecer na sua empresa pedindo emprego na área de P&D dizendo-se um inventor à la Leonardo da Vinci (1452-1519), não dê trela ao sujeito e responda que as vagas já foram preenchidas. O motivo? "[O] gênio italiano estava mais para carnavalesco ou cenógrafo do que para Steve Jobs, bolando engenhocas mais espetaculares e sonhadoras do que práticas". Acha pouco? Pois mostre esta frase ao seu departamento jurídico: "Se houvesse um equivalente ao Procon na Itália renascentista, da Vinci poderia muito bem ter sido processado por propaganda enganosa" (Folha de S. Paulo, 14/04/2019).


Mais do que um desenvolvedor de produtos, da Vinci parecia um empreendedor em busca de investidores-anjo. Numa carta a um deles, prometeu: "[t]enho métodos para destruir qualquer fortaleza, mesmo se suas fundações forem de rocha sólida". E punha-se a descrever as traquitanas que bolava para a dita missão. Mas "[q]uantos aparatos citados nessa carta já tinham sido testados, ou pelo menos construídos (...)?". Resposta curta e grossa: "Nenhum".Sua fama possivelmente tenha se originado das "engenhocas capazes de trazer brilho e esplendor a cerimônias de apresentações teatrais feitas para os nobres milaneses" e de sua "conversa sagaz e amável (...)". Um vendedor de PowerPoints cheio de lábia, em resumo. Lembrou do Eike Batista? Eu também.

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