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Já pensou deixar o cliente em paz?

Atendimento é como remédio: o que separa a cura do veneno é a dosagem


Em seu último livro, “É tudo tão simples”, Danuza Leão relembra rapidamente uma passagem sua por um hotel da rede Club Méditerranée. “Fui passar uma semana, no dia seguinte arrumei as coisas e voltei correndo, tal era a pressão para eu me socializar” escreve ela.


O Club Med conta com os chamados G.O.s (“gentis organizadores”), profissionais responsáveis por interagir com os hóspedes, batendo papo com eles nas refeições, convidando-os para participar das atividades organizadas pelo hotel etc. Olhando assim, parece algo inocente e até bem pensado – até você se hospedar lá.

“Eles (os G.O.s) sentavam-se à mesa conosco no café da manhã, almoço e jantar, puxando assunto, estivéssemos em grupo ou sozinhos. Ficavam insistindo para que participássemos das atividades coletivas e implicavam com quem não queria participar. Convocavam os hóspedes para uma ‘saudação ao sol’ no início da manhã – uma dança que eles faziam na beira da piscina e para a qual, prudentemente, hóspede nenhum se candidatava (eles pediam, então, que acompanhássemos a coreografia com as mãos…). Não dava para simplesmente deitar numa espreguiçadeira e ler um livro, eles estavam sempre em cima. Era muito chato. Era um saco, para ser sincera”, disse-me uma conhecida que também já esteve no hotel, concordando com o comentário de Danuza.

Os G.O.s do Club Med são um sintoma de um fenômeno que apelidei de “excesso de atendimento”: na intenção de agradar o cliente, as empresas orientam seus funcionários a uma pró-atividade que acaba passando longe da prestatividade – e terminam, invariavelmente, no mero aborrecimento. O excesso de atendimento nasce como quase tudo – das boas intenções –, mas resulta em algo por vezes pior que o seu extremo oposto, o descaso com o cliente. O motivo? Parte de uma premissa falsa: a de que todos os clientes querem ser bajulados, assistidos ou, mesmo, socializados quando vão às compras. A maior parte deles, arriscaria eu, quer simplesmente concretizar um objetivo, resolver um problema ou ser deixado em paz.

São exemplos dessa maldição os vendedores que “perseguem” os clientes pela loja, enquanto ele examina produtos nas prateleiras, dando pitacos sobre cada coisa que o sujeito pega na mão. E, como não poderia deixar de ser, os garçons que a todo momento perguntam para os comensais se “está tudo bem”, interrompendo a conversa dos que estão à mesa (quando não, fazem questão de encher os copos com mais água ou refrigerante, como se o próprio cliente não fosse capaz de fazê-lo).

O caso dos G.O.s é um pouco mais “grave”, digamos assim, porque mais do que um profissional solícito, ele se porta como um pseudoamigo à disposição dos hóspedes, simulando intimidade, exalando falsa alegria e tentando fazê-lo a participar da programação do hotel. A socialização é forçada, o relacionamento é forçado, a simpatia é fake – e isso pode tranquilamente destruir uma experiência de hospedagem, como aconteceu com Danuza.

O melhor remédio? A neutralidade. Profissionais atentos, prestativos e capacitados, acionado quando solicitados pelos clientes, podem não despertar paixões nos consumidores, mas dificilmente se tornarão inconvenientes – e, pode ter certeza, serão capazes de agradar um número maior de pessoas do que os adeptos do atendimento em excesso.

Dá até para fazer uma analogia: atendimento é como remédio; o que separa a cura do veneno está na dosagem.

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