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Como é que se diz "eu te amo"

O que um anúncio para o Dia das Mães diz sobre os tempos atuais

A publicidade de datas especiais, como Natal e Dia dos Namorados, costuma ser sempre muito parecida: partindo de sentimentos positivos presentes nas relações humanas, propõe materializá-los sob a forma de um presente. Trata-se de um recurso consagrado e que funciona justamente por preservar certa parcimônia no apelo comercial, ao travestir a transação de manifestação puramente afetiva.

Qual não foi minha surpresa, portanto, ao deparar com o anúncio que ilustra essa página, feito pela calçadista Arezzo para o Dia das Mães. A peça resume-se à foto de produtos da marca, discretamente acompanhados de seus respectivos preços, e encimadas por uma frase-equação: “mãe eu te amo = bolsa + sapato”. Assim, quase matemático.

Fiquei pensando nos possíveis motivos por trás de mensagem tão direta. E não pude deixar de concluir que a peça talvez seja um indicador das mudanças pelas quais a sociedade – e, por consequência, a publicidade – estão passando.

Nossas relações estão mais diretas e rápidas, e menos pacientes, duradouras. O tempo destinado aos afetos são menores, e a era digital permitiu uma certa sem-cerimônia no lidar com o outro. Como resultado, nossa disposição para consumir qualquer tipo de informação, seja ela factual, opinativa ou persuasiva (caso da publicidade) também diminuiu. Mais do que isso: ficamos mais desconfiados dos apelos de caráter comercial – fenômeno que um dos entrevistados do projeto The Communication (R)evolution, patrocinado pelo Grupo RBS, apelidou de “detector de besteiras”.

Assim, capturar a atenção para um anúncio, principalmente em uma mídia estática, como a impressa, exige uma comunicação sem muitas firulas. Quem sabe por isso a Arezzo tenha aproveitado a oportunidade para assumir, sem rodeios, que dia das mães não passa de comércio, mesmo: o presente constitui uma obrigação social da qual não se pode fugir. “Ama sua mãe?”, parece provocar o anúncio da Arezzo, para então completar, insidioso: “então prove!”.

É possível que à propaganda do futuro só caibam dois caminhos: oferecer conteúdo de muito boa qualidade, seja ele verídico ou ficcional, fazendo o consumidor esquecer que se trata de algo patrocinado por uma marca, ou partir para apelos diretos, como o da Arezzo, para não fazer o cliente perder seu precioso tempo – e nem obrigá-lo a acionar seu dectetor de bobagens. Afinal, como bem já afirmou o estilista norte-americano Tommy Hilfiger, ao se referir ao afetado mundinho da moda, “no fim das contas, tudo se resume a vendas”.

PS: volto a falar sobre consultoria na semana que vem, conforme prometido no post passado.

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