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Não copie Steve Jobs

Nem Bernardinho. Nem ninguém. Por quê? Ora, não existe fórmula para liderar

Tão logo Bernardinho começou a obter vitórias com a seleção de vôlei feminino, quase duas décadas atrás, parecia que uma pequena epidemia havia tomado conta das quadras brasileiras: treinadores de todas as equipes da liga nacional passaram a ter explosões de raiva à frente do banco de reservas. Xingamentos, ameaças de rasgar a própria camisa, faniquitos a cada erro do time – todos os trejeitos bernardinianos pareciam ter sido incorporados pelos comandantes técnicos do país. Nenhum deles, que eu saiba, copiara alguns dos outros princípios do treinador da seleção, como os treinos exaustivos, a obsessão pelos detalhes e o uso da estatística para esmiuçar adversários. Chiliques para as câmeras e para a torcida pareciam suficientes para angariar simpatia e fazer-se passar por um obcecado pela vitória (que só não viria caso os comandados, sempre eles!, não cumprissem direito com a sua parte, claro).

O sucesso da Apple na última década parece ter provocado efeito semelhante em executivos de todo o mundo, ao menos no que diz respeito à emulação do estilo Steve Jobs de liderar. A literatura light business explorou à exaustão o jeito Jobs de comandar equipes, criar produtos, fazer apresentações de impacto e tudo o mais. De uma hora para outra, ser autoritário, perfeccionista com bobagens e, por que não?, até um pouquinho mau caráter parecia justificar tudo em nome do sucesso empresarial.

Mas essa ilusão talvez se desfaça antes mesmo de criar raízes e virar mito. A última edição da revista americana Wired pergunta, em sua reportagem de capa, se a trajetória de Jobs é “uma inspiração ou uma advertência”. E explica: embora busquemos copiar pessoas bensucedidas, a lição do CEO da Apple parece ser muito pouco dignificante: “viole toda norma de interação social ou empresarial que o separe de seus objetivos”.

Jobs, sabemos todos, destratava empregados, implicava com coisas desimportantes e dava pouca atenção à própria família – tudo em nome da arrogância de achar-se sempre certo e da ambição de fazer história. Wired pergunta se “vale a pena ser Steve Jobs”, dado o preço que se paga em tentar imitar seu jeito maníaco de fazer as coisas. Eu acrescentaria: será mesmo que a pretensa lição que sua trajetória oferece é muito diferente da de qualquer outro empreendedor?

Explico.

Não existe uma única forma de fazer as coisas acontecerem nas organizações. Há exemplos de sucesso e de fracasso para todos os gostos: líderes carismáticos que venceram ou afundaram, visionários autocráticos que ficaram bilionários ou faliram, gestões participativas duradouras ou abortadas em menos de um mês. É possível construir teorias de todos os tipos quando se examina a vida dos líderes bem e mal sucedidos e de seus respectivos estilos de comandar. Como Henry Mintzberg bem recorda em seu livro “Managing” (Bookman, 2010), recuperando uma citação de pesquisa publicada em 1977, “quando os padrões de fracasso são examinados, são tão contraditórios que assustam. Os gerentes se envolvem em detalhes demais – de menos. São cautelosos demais ou destemidos em excesso. São excessivamente críticos ou receptivos. Planejam e analisam e procrastinam ou então pulam às cegas sem análise ou planejamento”.

Zé Roberto Guimarães, menos explosivo que Bernardinho, é tão vencedor quanto seu rival. Bill Gates, sem qualquer apreço por design ou perfeccionismo, fez uma empresa tão grande ou maior que a de Jobs. Há empresários que fizeram fortuna bajulando clientes; outros, ignorando-os. E assim vai.

Há exemplo para tudo, portanto. E se existe alguma lição nas trajetórias de destaque – e nas de fracasso, diga-se – é a de que não existe padrão. Felizmente.

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