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Vendendo mais para os mesmos

O desafio das marcas de luxo: como explorar ao máximo o potencial econômico de um grupo de consumidores relativamente pequeno?

A recente abertura do Shopping Cidade Jardim, em São Paulo, trouxe novas lojas de luxo para uma cidade já bastante bem servida por elas. A questão suscitada não poderia ser outra: “há mercado para mais estabelecimentos?”. Considerando que o consumo de bens de luxo no país é realizado essencialmente por brasileiros, sem a presença maciça de turistas, a pergunta é pertinente. Afinal, há uma mesma e restrita base de consumidores potenciais para um número crescente de pontos-de-venda.

O desafio enfrentado pelas marcas na capital paulista não é muito diferente daquele verificado ao redor do mundo: como explorar ao máximo o potencial econômico de um target relativamente pequeno?

Existem sete medidas básicas para responder a esse desafio. São elas:

1) Criar gradações de sofisticação dentro do portfólio de produtos e marcas da empresa. Diferentes níveis de luxo oferecem ao consumidor a perspectiva da conquista; fazem-no ambicionar a próxima compra mesmo sem já ter desfrutado da primeira. Exemplos típicos desse tipo de tática são as diferentes marcas da Armani, que estão visivelmente hierarquizadas; comprar um Armani Exchange é o primeiro passo para adquirir, mais adiante, um Giorgio Armani. O mesmo vale para as montadoras de automóveis. Há BMWs que custam desde R$ 100 mil até R$ 700 mil.

Gradações de luxo dentro de um mesmo grupo ou marca são especialmente importantes para atender àqueles consumidores que enxergam o luxo como um símbolo de conquista social e distinção. Para esta categoria de clientes, é importante vislumbrar que uma marca é capaz de acompanhar, com produtos de diferentes níveis, a sua própria ascensão social.

2) Lançar periodicamente novos produtos, renovando-os estética e funcionalmente.

Ir a lojas e encontrar sempre os mesmos itens à venda é um convite ao tédio e à indiferença. Novas mercadorias, com diferenciais expressivos em relação às anteriores, ajudam a estimular a visita à loja e a renovar o interesse pela marca. A Louis Vuitton, com a introdução periódica de novos modelos de bolsas, é um bom exemplo desse tipo de ação - que, aliás, é a tônica em toda a indústria da moda.

3) Investir na subsegmentação da base de clientes. Quando um mercado já está perfeitamente atendido, a saída é subsegmentá-lo, dividindo os consumidores em pequenos nichos conforme interesses e preferências específicos. A homogeneidade dos mercados é um mito que a indústria de refrigerantes já derrubou há tempos, com a subdivisão de seu portfólio entre inúmeras modalidades de bebidas derivadas da original. No luxo, há possibilidades semelhantes. Usando a Armani novamente como exemplo, nota-se claramente que marcas como Giorgio, Emporio, Exchange e Jeans estão dispostas não só em uma escala hierárquica, como também estilística – ou seja, voltadas a atender consumidores com preferências estéticas distintas. A Ralph Lauren foi outra marca que compreendeu bem essa necessidade de subsegmentar, investindo em duas frentes: uma, demográfica, atendendo aos públicos masculino, feminino, jovem e infantil; outra, psicográfica, calcada em estilos de vida: casual, formal, esportivo, universitário, etc.

4) Desmaterializar a oferta é, talvez, a mais radical e desafiante das ações possíveis. O que significa desmaterializar? Basicamente complementar a oferta de produtos com serviços e experiências. O motivo: produtos têm uma capacidade restrita de diferenciação, o que implica uma limitação no preço máximo que podem atingir. Serviços e experiências, ao contrário, tendem a ser únicos, o que facilita a diferenciação e a prática de preços elevados.

As possibilidades de diferenciação dos serviços estão no profissional que o executa e no ambiente no qual é oferecido. Quando bem gerenciados, ambos podem se tornar incopiáveis. Já as experiências dependem do consumidor. Ele vivencia, participa e se envolve, construindo uma memória própria a respeito do episódio – o que o torna singular e irreproduzível.

A Ferrari percebeu a importância de proporcionar experiências ao oferecer cursos de pilotagem aos compradores de seus carros. Esses cursos ocorrem em autódromos e há o apoio de uma equipe nos boxes. Muito mais do que uma aula de direção, o que está sendo proporcionado é a realização de uma fantasia universal entre homens: a de ser um piloto profissional.

5) Explorar o efeito ‘estilo de vida’ parte do princípio de que existe, entre os consumidores, uma tendência intuitiva de procurar coerência entre as diferentes escolhas de consumo. Sob essa ótica, vestir-se de maneira refinada implica dirigir um carro sofisticado, freqüentar restaurantes caros e fazer viagens internacionais, por exemplo – ou, para usar uma expressão muito em voga, adotar um “estilo de vida” único e harmônico. Essa ligação imaginária entre diversas categorias de bens oferece duas possibilidades para as marcas de luxo. A primeira, de lançar produtos em áreas próximas às de seu negócio original. Exemplo típico: grifes de vestuário que investem em perfumaria e cosmetologia estão explorando uma ligação presente no imaginário do consumidor, que atribui a esses itens uma mesma função, a de cuidado com a aparência pessoal. A outra oportunidade é a de promover associações com marcas e empresas de outros ramos, numa combinação de expertises e atributos de imagem. É o caso das recentes parcerias da Hermés com uma fabricante de helicópteros e da Versace com uma cadeia hoteleira internacional.

6) Ritualizar o consumo é uma forma de sugerir que, mais do que comprado, o produto deve ser apreciado. Perrier e Evian sempre foram consideradas águas minerais de luxo, mas seu consumo jamais foi associado a harmonizações gastronômicas ou degustações orientadas. Com o recente boom do mercado mundial de águas minerais, abriu-se a oportunidade para essas marcas adotarem rituais semelhantes aos existentes no universo do vinho. Conseguiu-se, assim, fazer com que o consumo de um produto aparentemente banal se tornasse propício para o surgimento de toda uma série de procedimentos e conhecimentos específicos, renovando o interesse do consumidor.

7) Criar o consumidor do futuro, desenvolvendo linhas ou marcas específicas para crianças e adolescentes, é uma medida que tem dois objetivos. O primeiro é o de capturar a parcela do orçamento dos adultos destinada a presentear filhos, sobrinhos e netos – e que via de regra é despendida em lojas especializadas. O segundo é de preparar as crianças e os adolescentes de hoje para tornarem-se clientes da marca amanhã. A Daslu, com suas linhas Bebê, Kids e Teens, é um exemplo típico dessa tentativa de construir hoje a clientela dos próximos 10 ou 20 anos.

O desenvolvimento do consumidor do futuro é mais do que uma medida de subsegmentação, uma vez que constitui um investimento de longo-prazo. Nem sempre as linhas destinadas a crianças e teens proporcionam lucro, mas cumprem a função de preparar o jovem consumidor atual para que seja um cliente freqüente da marca quando adulto.

Recentemente, o mercado mundial de luxo viu emergir uma nova categoria de consumidores, formada por pessoas ávidas por adquirir produtos de grife, mas sem capacidade econômica para tanto. A saída foi adaptar a oferta ao bolso desse público-alvo, com mercadorias mais acessíveis. Os resultados foram inegavelmente bons. No entanto, não se deve esquecer que o target prioritário para qualquer marca de luxo deve ser o de consumidores de alto poder aquisitivo. Trata-se de um público-alvo pequeno e imprescindível, pois é ele que proporciona as melhores margens de lucro e confere prestígio às marcas. Prestígio esse, aliás, fundamental para alavancar negócios junto a consumidores menos endinheirados.

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